O engenheiro Mira Amaral diz-se cansado das lides político-partidárias e tem toda a razão, coitado, aquilo é coisa de muita canseira, de muito desgaste - e de poucas, oh! tão poucas compensações. Uma pessoa entrega-se de alma e coração, passa uma vida a servir o bem público, deixa para trás carreiras profissionais e projectos de enorme futuro, dá-se, literalmente dá-se, ao país, e no fim o que é que recebe? Nada. Quase nada. Umas palavrinhas de circunstância, um louvor no "Diário da República", pouco mais. Uma pessoa gasta os seus melhores e mais produtivos anos metida em cargos exigidos pela "vida político-partidária" e no fim sai de lá como? Sem nada. Quase com uma mão à frente e outra atrás. É naturalíssimo que uma pessoa se canse...
E o engenheiro Mira Amaral cansou-se. Ao fim de tantos anos de ministro e de gestor público, diz agora que não tem mais disponibilidade para a vida político-partidária. Então ele entregou-se todo ao país e o país só lhe dá uma reformazita de 18.000 euros por mês!... Uma bagatela de 3600 contos por mês, ele que ainda está cheio de força para trabalhar, ele que ainda tanto tem a dar a quem precise dos seus préstimos! Com apenas 58 anos de idade, sentiu-se prematuramente obrigado (cansaço, lá está...) a pedir a reforma e recolhe a casa com uma pensãozita de 3600 contos. Só 3600 contos por mês até ao fim da vida, ele que se devotou à causa pública durante anos e anos, ele que sacrificou uma carreira profissional brilhante à vida político-partidária!
E agora, que vai fazer o engenheiro Mira Amaral, com essa reformazita no bolso como única compensação por tanto sacrifício? Sim, que vai ele fazer? É que a vida está cara, há rendas para pagar, filhos para criar, compras para fazer, comer todos os dias, e roupa, e livros, e carros, e telefone, água, luz, etc., etc., para que é que chegam uns míseros 3600 contos por mês? E depois, com 58 anos, ainda não é um homem inválido, longe disso, ainda pode muito bem trabalhar, mas com essa idade às tantas já não é fácil arranjar emprego, para mais atendendo à sua indisponibilidade para a vida político-partidária, às tantas vai ter que se contentar com um cargozito de "assessor" ou de "consultor" de algum grande banco, vejam lá, "assessor", "consultor", se calhar a ganhar só dois ou três mil contos por mês, ele que foi ministro tantos anos, ele que foi presidente da Caixa durante quase dois anos!, ele que ganhava para aí cinco mil contos, e agora a reforma de três mil e seiscentos, aos 58 anos, e talvez um gabinete de "consultor", aos 58 anos, e talvez uma vida de apertos, aos 58 anos, tudo graças à malfadada vida político-partidária a que com tanta generosidade e desprendimento se entregou durante uma vida.
Razão tem o ministro Bagão Félix: isto é obsceno. País mal agradecido, que não sabe recompensar com justiça os seus mais esforçados e abnegados servidores! E depois ainda nos admiramos que eles se cansem da vida político-partidária... Com estas pensões de miséria, quem é que não se cansaria?...
E o engenheiro Mira Amaral cansou-se. Ao fim de tantos anos de ministro e de gestor público, diz agora que não tem mais disponibilidade para a vida político-partidária. Então ele entregou-se todo ao país e o país só lhe dá uma reformazita de 18.000 euros por mês!... Uma bagatela de 3600 contos por mês, ele que ainda está cheio de força para trabalhar, ele que ainda tanto tem a dar a quem precise dos seus préstimos! Com apenas 58 anos de idade, sentiu-se prematuramente obrigado (cansaço, lá está...) a pedir a reforma e recolhe a casa com uma pensãozita de 3600 contos. Só 3600 contos por mês até ao fim da vida, ele que se devotou à causa pública durante anos e anos, ele que sacrificou uma carreira profissional brilhante à vida político-partidária!
E agora, que vai fazer o engenheiro Mira Amaral, com essa reformazita no bolso como única compensação por tanto sacrifício? Sim, que vai ele fazer? É que a vida está cara, há rendas para pagar, filhos para criar, compras para fazer, comer todos os dias, e roupa, e livros, e carros, e telefone, água, luz, etc., etc., para que é que chegam uns míseros 3600 contos por mês? E depois, com 58 anos, ainda não é um homem inválido, longe disso, ainda pode muito bem trabalhar, mas com essa idade às tantas já não é fácil arranjar emprego, para mais atendendo à sua indisponibilidade para a vida político-partidária, às tantas vai ter que se contentar com um cargozito de "assessor" ou de "consultor" de algum grande banco, vejam lá, "assessor", "consultor", se calhar a ganhar só dois ou três mil contos por mês, ele que foi ministro tantos anos, ele que foi presidente da Caixa durante quase dois anos!, ele que ganhava para aí cinco mil contos, e agora a reforma de três mil e seiscentos, aos 58 anos, e talvez um gabinete de "consultor", aos 58 anos, e talvez uma vida de apertos, aos 58 anos, tudo graças à malfadada vida político-partidária a que com tanta generosidade e desprendimento se entregou durante uma vida.
Razão tem o ministro Bagão Félix: isto é obsceno. País mal agradecido, que não sabe recompensar com justiça os seus mais esforçados e abnegados servidores! E depois ainda nos admiramos que eles se cansem da vida político-partidária... Com estas pensões de miséria, quem é que não se cansaria?...
FIDALGO, Joaquim, "Que Miséria", Público,22 de Setembro de 2004
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